terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Natal Disfuncional

Lembro-me dos Natais da minha infância. Quando falo de infância refiro-me aquela altura em que habitava um corpo de criança. Isto porque tal como o Peter Pan, recuso-me a crescer (e só não ando de collants verdes, porque experimentei uma vez e fazem-me o rabo gordo).

Via o Natal como a altura em que recebia brinquedos e comia doces, o que na minha visão de criança gulosa, era algo como atingir o Nirvana para os Budistas, ou o Paraíso para os católicos, mas - e isto para os últimos - sem a parte chata de falecer...

Nunca houve muito o conceito de família reunida. Talvez porque nunca houve muito o conceito de família em primeiro lugar...
Recordo-me de uma vez o clã materno se ter reunido em casa do meu avô, e aquilo ter sido bastante animado, e ter terminado com insultos e porrada. Parecia um espectáculo da WWE....
Do lado paterno não era melhor. O meu pai tinha divergências com o meu avô e não falavam, o meu tio tinha divergências com o meu pai e também não falavam, e mais tarde - para não quebrar a tradição - também eu tive divergências com o meu pai, e deixamos de falar...

Houve uma altura em que a nossa consoada era feita a quatro. A minha mãe atrasava-se sempre devido a enorme carga de trabalho que tinha nessa época, a minha irmã andava de um lado para o outro no salão também, o meu pai tinha certas reticências em aproximar-se da cozinha, e eu era muito novo para cozinhar (ainda hoje sinto isso, mas por questões de sobrevivência já enfrento as panelas como um guerreiro espartano! Muitas vezes de cuecas como o Leónidas no filme 300! E sim com os mesmos abdominais, embora mais ocultos...).
Basicamente comíamos bacalhau cozido com batatas e couves (o que me fazia confusão, pois não considerava aquela refeição digna da celebração do nascimento do filho de Deus), e depois ingeríamos uma quantidade enorme de açúcar, farinha, chocolates e fritos... como se aquela fosse a primeira e ultima vez que comeríamos doces na vida!

A meia-noite trocávamos presentes, o meu pai ia para o café ter com os amigos, e pronto voltávamos a ser uma família disfuncional embora com mais brinquedos, e um nível de glicemia mais alto no sangue.

Entretanto as coisas mudaram, os anos passaram, o meu pai partiu, a minha irmã casou... e apareceu uma criança muito fofa na nossa vida, que por acaso é meu sobrinho. 
Recordo os últimos natais como os melhores. A nossa família juntou-se à família do meu cunhado. Senti que a minha mãe estava em paz, que a minha irmã estava feliz, o meu afilhado estava em êxtase, e que todos estávamos bem... E já gosto de bacalhau cozido... 

Este ano estou ainda mais ansioso por esta celebração. Desde Agosto que não estamos juntos, e há qualquer coisa nesta época que amplia a nostalgia, o amor familiar, a vontade de estar com os nossos... de os abraçar, de ver os seus sorrisos (de tirar umas selfies e as publicar no facebook).
Hoje sinto apenas que o único aspecto disfuncional da nossa relação familiar, e que não podemos estar juntos sempre que queremos.
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